1º Domingo do Advento - A Esperança

Comentário Moral do Evangelho




Evangelho — Lc 21,25-33

25. Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: Haverá sinais no sol, e na lua, e nas estrelas, e na terra consternação dos povos pela confusão do bramido do mar e das ondas.
26. Mirrando-se os homens de susto, na expectação do que virá sobre todo o mundo, porque as virtudes dos céus se abalarão.
27. E então verão o Filho do homem vir sobre uma nuvem com grande poder e majestade.
28. Quando começarem, pois, a cumprir-se estas coisas, olhai e levantai as vossas cabeças, porque está próxima a vossa redenção.
29. E disse-lhes esta comparação: Vede a figueira e todas as árvores.
30. Quando começam a desabrochar, conheceis que está perto o estio.
31. Assim também, quando virdes que acontecem estas coisas, sabei que está próximo o reino de Deus.
32. Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que todas estas coisas se cumpram.
33. Passará o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão.

A esperança

Dirigindo-se aos que estiverem vivos ao aproximar-se o fim do mundo, Jesus Cristo lhes aconselha que levantem a cabeça e olhem para cima, porque estará próximo o reino de Deus. É uma recomendação de pôr em Deus sua esperança. Hoje, nos tempos perturbados e incertos que atravessamos, parece que as catástrofes preditas pelo divino Mestre estão se realizando pouco a pouco.
É, pois, o tempo de pôr a nossa confiança em Deus, de esperar nele, pois só dele pode vir a salvação. A esperança é uma virtude teologal ou divina, porque tem por objeto direto o próprio Deus.
Para avivar esta esperança, examinemos hoje:
1º O seu objeto.
2º Os seus motivos.

I. O objeto da esperança

A esperança, como virtude cristã, é uma graça de Deus, que nos dá firme confiança de obter a felicidade eterna na outra vida e os meios de consegui-la neste mundo.
Neste sentido, a esperança, como virtude, distingue-se claramente da esperança terrena, que é uma simples disposição da alma e não virtude.
No Antigo Testamento, os bens esperados por aqueles que serviam a Deus eram sobretudo temporais; no Novo Testamento, tais bens são sobretudo espirituais, conforme o conselho do divino Mestre: Procurai antes de tudo o reino de Deus e tudo o mais vos será dado por acréscimo. (Lc 12,31)
O objeto principal é, pois, a posse de Deus no céu.
Aqui, na terra, o homem desfruta apenas prazeres imperfeitos. As próprias delícias intelectuais da ciência e da amizade são incapazes de saciar o coração humano. Só Deus pode nos satisfazer plenamente, por ser Ele o único Bem perfeito e completo.
O segundo objeto da esperança é a graça. Tal graça é habitual ou atual.
A graça habitual torna a nossa alma mais agradável a Deus, adorna-a e a embeleza. A graça atual afeta sobretudo as faculdades da nossa alma. É um auxílio passageiro que nos é dado no momento preciso, ou melhor, no ato mesmo em que precisamos. Esta distinção é importante e resolve quantidade de problemas da vida espiritual, que diariamente presenciamos.
A graça habitual adorna a alma; a graça atual faz agir as faculdades da alma. É esta dupla graça que é o segundo objeto da esperança. Os próprios bens materiais não ficam excluídos da esperança cristã, enquanto podem ser auxiliares ou meios indiretos de salvação. É o que o Salvador nos faz entender, mandando-nos pedir no “Pai Nosso” o pão de cada dia. Este compreende: o pão espiritual da alma, que é a Sagrada Comunhão, e o pão material do corpo, que é o necessário à subsistência.
Os bens espirituais, por serem os mais necessários e referirem-se diretamente a Deus, ocupam, pois, o primeiro lugar; os segundos bens, os temporais, devem ser pedidos com inteira submissão à vontade de Deus.

II. Motivos da esperança

Por que devemos ter em Deus uma esperança completa, certos de que Ele nos dará, se fizermos o que Ele nos pede, o céu, a graça e, secundariamente, os bens temporais?
Os motivos de tal esperança são os três grandes atributos de Deus:
o seu poder;
a sua bondade;
a sua fidelidade.
De fato, para alguém merecer toda a nossa confiança e dar o que promete, é preciso que possua o que promete; que seja bondoso para dá-lo e fiel à promessa feita.
Encontramos em Deus esta tríplice base da nossa esperança.
a) Deus pode dar o céu como recompensa; na terra, a graça para merecê-lo e os bens temporais que possam ser úteis para esse fim: Ele é a onipotência divina.
b) Deus quer dar-nos estes bens, pois Ele é a bondade infinita; e é próprio, é da essência da bondade comunicar os seus benefícios. Bonum est sui diffusivum, diz São Dionísio. É por isso que Deus manifestou sua onipotência nas grandes obras da Criação e da Redenção. É por isso ainda que Ele nos enalteceu até a ordem sobrenatural por meio da graça e nos predestinou à vida eterna.
c) Quanto à fidelidade às suas promessas, Deus não pode faltar; Ele empenha até a sua justiça, desde que trazemos a nossa devida cooperação. De fato, os bens que Deus nos prometeu, Jesus Cristo os mereceu para nós, pela Redenção. É o que fazia dizer a S. Paulo, e nós podemos dizê-lo com ele: — somos servos de Deus, para a esperança da vida eterna que Deus, que não mente, prometeu antes do começo dos séculos. (Tt 1,2)

III. Conclusão

Do exposto, vê-se que a esperança é uma virtude sobrenatural. É uma virtude, isto é: um hábito do bem, exigindo esforço. É sobrenatural como a fé e a caridade: no seu princípio, que é a graça; no seu objeto, que é o céu; no seu motivo, que são os atributos de Deus.
Para praticar esta virtude é preciso, de vez em quando, fazer atos de esperança, sobretudo nas tentações, nas dificuldades e na hora da morte. Tais atos têm a imensa vantagem de acostumar-nos a elevar os pensamentos e a convencer-nos de que tudo neste mundo depende de Deus. Peca-se contra esta virtude básica pelo desespero e pela presunção, que são os dois extremos da virtude da esperança.
A Sagrada Escritura nos dá tocantes exemplos de esperança em Deus nas histórias de Judite (Jd 13), do filho pródigo (Lc 15) e do bom ladrão (Lc 23), como dá exemplo de dois pecados contra a esperança: o desespero de Judas (Mt 20,7), a presunção de Pedro (Mt 26,33).

Exemplos

1 — Palavra de criança

Era numa aula de catecismo.
O Vigário acabava de contar às crianças o desespero e o suicídio de Judas e concluiu nestes termos:
Se um dentre vós, meus filhos, tivesse a infelicidade de trair o bom Jesus pelo pecado, estou certo de que não imitaria a Judas, indo enforcar-se.
— “Eu o faria, senhor Vigário,” interrompeu um menino, reputado entre os seus camaradas pela vivacidade de espírito.
— “Como, Joãozinho!? o que dizes... tu irias te suspender numa árvore?
— “Sim, senhor Vigário, eu iria me suspender ao pescoço do bom Jesus, para lhe pedir perdão. Se Judas se houvesse suspendido deste modo, seu crime teria sido perdoado.
Nunca se deve desesperar da infinita bondade de Deus.

2. — Um Apólogo — Esperar sempre

Um grão de trigo caiu um dia da mão do semeador numa terra bem preparada. Cobriram-no de terra: o grão julgou-se perdido: “enterrado vivo!...” exclamou triste.
Poucos dias depois regaram os sulcos.
— “Desgraçado de mim,” disse chorando o grão, “estou envenenado!
Veio o inverno com os seus serenos, neves e gelo...
— “Nem sol, nem vida!” gemeu o prisioneiro.
Semanas depois, o grão rompeu seu invólucro, sentiu-se apodrecer.
— “Tudo está acabado,” soluçou o grão, “eis a podridão, a morte!
Mas eis que, na primavera, essa podridão germinou e gerou uma nova vida.
Uma haste foi se formando, furou a terra, elevou-se e, enfim, foi coroada por uma espiga que se dourou e amadureceu ao calor benfazejo do sol.
Este apólogo é para os que se sentem tentados ao desespero.
Grãos de trigo somos todos nós!
Por que duvidar do sol fecundo do bom Deus?