I. No século XVI.
II. Nos séculos XVII e XVIII.
A palavra grega ἀδιάφορα significa "coisas indiferentes". Existe, na ordem moral, algo indiferente, isto é, que não seja nem bom, nem mau, algo que se possa, à vontade, fazer ou não fazer? Esta é uma questão que, desde sempre, foi colocada por moralistas, filósofos e teólogos. Ver ATO HUMANO, MORALIDADE. Sabe-se que os estóicos estenderam consideravelmente o campo dos ἀδιάφορα e declararam indiferentes os atos que, diziam eles, deixavam a alma intacta ao macular apenas o corpo. Este termo, ἀδιάφορα, foi retomado no século XVI e depois no XVII e XVIII, pelos protestantes, em duas circunstâncias bem diferentes, e serviu por duas vezes para designar um partido ou uma escola.
I. No século XVI.
Em 1548, Carlos V, após desentendimentos com o Papa Paulo III a respeito do concílio, decidiu publicar o Interim de Augsburgo, pelo qual pretendia estabelecer uma organização eclesiástica provisória. Os protestantes, aos quais o Interim fazia concessões bastante amplas, deveriam se ater ao que o Interim regulava até que o concílio tivesse tomado suas decisões. Esse compromisso foi aceito sem grandes dificuldades na Vestfália, nos países renanos, e em algumas regiões do sul da Alemanha; mas em todos os outros lugares desencadeou novas discórdias, principalmente no norte da Alemanha. Entre os dissidentes, formou-se, no entanto, um partido moderado liderado por Melanchthon. A pedido de Maurício da Saxônia, Melanchthon e alguns teólogos saxões redigiram um novo Interim, chamado Interim de Leipzig, que foi adotado por Maurício e pelos Estados do Eleitorado. Nele, admitiam-se como coisas indiferentes ou ἀδιάφορα certos costumes que se podia observar sem transgredir as leis da Sagrada Escritura — jejuns, festas, cânticos em latim, uso da sobrepeliz, de velas, etc.; aceitava-se até a confirmação e a extrema-unção. Quanto à autoridade da Igreja, escapava-se por meio de uma distinção cheia de reticências, declarando-se reconhecer a autoridade dos bispos e do papa, com a condição de que essa autoridade fosse empregada para construir, não para destruir, o edifício da Igreja. Em Leipzig mesmo, Antônio Lauterbach disse a Melanchthon sobre o Interim: "Est collusio cum Satana." E Melanchthon respondeu: "É verdade, mas o que podemos fazer?" Logo começou uma campanha ferrenha contra os adiaforitas, liderada com rara veemência por Flacius Illyricus. De Magdeburgo, onde Flacius se exilou, partiram inúmeros panfletos. Sob ofensas grosseiras, encontrava-se esta tese séria de que, em matéria de fé, não pode haver nada indiferente, que os ἀδιάφορα sempre pressupõem liberdade, e que a menor das coisas deixa de ser indiferente quando é imposta. A maioria dos protestantes seguiu Flacius; a controvérsia continuou entre os luteranos rígidos e os discípulos de Melanchthon até a Fórmula de Concórdia de 1580. O formulário reconheceu alguns ἀδιάφορα, mas em pequeno número e de uma natureza específica: em outras palavras, certas cerimônias, certos usos eclesiásticos foram deixados à discrição, não de particulares, mas das Igrejas. Esta solução, que não dava plena satisfação a ninguém, foi geralmente aceita porque as preocupações se voltaram para outras discussões.
II. Nos séculos XVII e XVIII.
Cerca de cem anos mais tarde, viu-se renascer a controvérsia adiáfora, mas desta vez em toda a sua extensão e em seu sentido moral. O iniciador do movimento pietista, Spener (1635-1705), que se chocava com a leviandade dos costumes de seu tempo e com a vida pouco cristã de muitos crentes, sustentou que diversos divertimentos, como a dança, o jogo, os espetáculos, não eram compatíveis com a seriedade e a dignidade da vida cristã e deviam ser condenados. Os ortodoxos responderam aos pietistas que essas eram coisas indiferentes e que, portanto, não se tinha o direito de condená-las. A controvérsia continuou e ainda persiste, mas, em suma, restringiu-se consideravelmente.
Os autores, de fato, estão praticamente de acordo neste ponto: não há, na vida cristã, um ato propriamente dito indiferente. Todo ato possui um caráter moral, pois tem ou pode ter alguma relação "com a vontade de Deus e a vocação do crente". Admitindo-se isso, há ações simplesmente permitidas, isto é, das quais se pode abster ou que se pode realizar, contanto que se aja sob o olhar de Deus? Sim, dizem Chalybäus, Rothe, Palmer, Martensen, Wuttke; sem isso, o homem cairia no escrúpulo e perderia toda espontaneidade. Não, dizem Fichte, Schleiermacher e vários teólogos; toda ação do homem é ou não desejada por Deus; portanto, é dever do homem realizá-la ou não realizá-la; não há coisas simplesmente permitidas.
Reduzida a esses termos, se a discussão mantém seu interesse especulativo, perde muito de seu valor prático. De fato, os partidários da segunda opinião não proíbem as ações que os outros qualificam de simplesmente permitidas; dizem que é preciso vinculá-las a um dever, realizá-las por dever; e os partidários da primeira opinião, ao mesmo tempo que declaram que existem atos simplesmente permitidos, acrescentam que é preciso realizá-los sob o olhar de Deus; uma distinção assim não acarretará grandes divergências na conduta diária dos cristãos de uma ou de outra escola.
A. BAUDRILLART.