Acidente - Segundo a Doutrina Escolástica

I. Natureza. — Este termo, do ponto de vista filosófico, apresenta dois significados distintos.

Primeiramente, refere-se a qualquer noção que possa ser ou não apropriada a um ser: como a ciência em relação à natureza humana. Nesse sentido, o acidente se opõe à espécie, ao gênero e à diferença, que pertencem à essência do ser, e à propriedade, que, embora não constitua essa essência, a segue necessariamente. É o acidente lógico, que é classificado entre os cinco universais ou predicáveis.

Em outro sentido, o acidente chamado físico não designa mais uma relação entre duas noções consideradas pela mente, mas um ser real, ou seja, qualquer realidade distinta da substância. É assim que se fala dos acidentes eucarísticos, da graça santificante, como uma qualidade acidental recebida na alma. Os escolásticos, de fato, ao contrário da maioria dos filósofos modernos, que veem nos acidentes apenas aspectos diversos da substância, os consideram com razão como realmente distintos dela. Enquanto a substância é o ser em si, que não precisa de um sujeito para existir, sendo ela mesma sujeito, o acidente é o ser em outro (ens in alio), que precisa de um sujeito para a inerência. Essa é a característica do acidente. Uma coisa pode estar em outra de muitas maneiras: como a parte está no todo, como um ser está no lugar que o contém, como o efeito está em sua causa, como um princípio constitutivo está em outro princípio que ele deve agir e determinar, como, segundo os escolásticos, a forma substantiva está na matéria. Apenas o acidente possui essa relação de inerência com a substância, em virtude da qual está unido a ela de maneira intrínseca e natural, não mecanicamente e por simples aderência ou justaposição, de modo que dependa necessariamente da substância em seu ser. Isso é o que significam essas expressões e outras semelhantes da escolástica: o ser do acidente consiste em estar em outro, accidentis esse est inesse; o acidente não é o termo da operação, mas a substância; o acidente não é feito, mas o sujeito é feito acidentalmente tal. No entanto, nada impede, como será estabelecido em outro lugar (ver artigo sobre EUCARISTIA [Acidentes]), que essa inerência do acidente à substância não seja atual, mas permaneça apenas como uma exigência não realizada, no caso de uma força superior, como a causalidade divina, vir a substituí-la. — Se a esse relacionamento essencial e principal de inerência e dependência em relação à substância, acrescentarmos o relacionamento de causalidade, pelo qual o acidente, como causa formal, não a determina a ser absolutamente (esse simpliciter), como faz a forma substantiva, mas simplesmente a ser tal (esse tale), teremos dado, em seus traços fundamentais, a análise do acidente, como entendido pela escolástica.

II. Espécies. — Distinguem-se nove espécies de acidentes, que, juntamente com a substância, formam as dez categorias ou predicamentos de Aristóteles. Antes de fornecer uma breve definição de cada uma, é importante lembrar que os escolásticos costumam dividir o acidente, tomado em geral, em acidente absoluto e acidente modal. Embora essa divisão nem sempre seja claramente definida, comumente se chama de acidente absoluto aquele que acrescenta à substância uma determinação específica e relativamente importante, como a quantidade; o acidente modal, por sua vez, significa mais uma determinação, um estado do acidente absoluto, e a maneira (modus) pela qual este afeta a substância. Assim, o movimento, a graça santificante, são acidentes absolutos; a velocidade do movimento, o aumento ou a diminuição da graça, são modos.

1° A quantidade, o principal acidente dos corpos, é o acidente pelo qual a substância possui partes, algumas fora das outras, seja porque são atualmente distintas entre si, nesse caso é a quantidade discreta ou numérica, seja porque são apenas divisíveis, é a quantidade contínua ou extensão. A quantidade virtual é a quantidade aplicada metaforicamente a seres que não são suscetíveis de quantidade discreta ou contínua; assim, fala-se da extensão e da profundidade de uma ciência.

2° A qualidade é o acidente que aperfeiçoa e modifica a substância em seu ser e em suas operações. É ela que, no sentido mais próprio da palavra, modifica os seres e os torna tal como são. Suas inúmeras espécies foram reduzidas a quatro gêneros: as potências ou faculdades, ativas e passivas, ou seja, os princípios imediatos das ações e das determinações da substância, como a inteligência, a vontade; os hábitos ou maneiras de ser, bons ou maus, das potências e da substância, como as virtudes, a saúde. Os dois outros gêneros são próprios do mundo dos corpos: são as qualidades sensíveis, que determinam uma impressão nos sentidos, como os sons, as cores; e as figuras, regulares ou irregulares, que são as diversas determinações que afetam a quantidade como tal, como a forma esférica ou cúbica.

3° A relação é a maneira de ser de uma coisa em relação a outra. Exige, além de seu sujeito, como todos os outros acidentes, um termo ao qual o sujeito se relaciona, e o fundamento em virtude do qual ela existe. Existem, como veremos (ver o termo RELAÇÃO), quatro relações na Santíssima Trindade: a paternidade, a filiação, a espiração ativa e a espiração passiva. As relações se dividem principalmente em reais e lógicas, devido aos diversos fundamentos que lhes dão origem.

4° e 5° A ação e a paixão são os dois aspectos opostos da mudança que pode afetar um ser: na medida em que procede da causa, é a ação, na medida em que é recebido no sujeito, é a paixão. A principal divisão da ação é em ação imanente e transitiva; a primeira permanece no ser de onde emana e é o seu aperfeiçoamento: como as ações vitais, como o pensamento e o amor; a segunda passa para um sujeito distinto da causa para lhe conferir um aperfeiçoamento, como a ação de empurrar um corpo.

6° A presença no lugar (ubi, ubicatio) é chamada de circunscritiva ou definitiva, dependendo se o ser está em um lugar com as partes de sua quantidade, que correspondem às partes do lugar, ou se está inteiramente em cada uma dessas partes; a presença circunscritiva é a presença natural dos corpos, a presença definitiva é a dos espíritos. O lugar (extrínseco) foi definido por Aristóteles: a superfície interna dos corpos circundantes nos quais uma coisa está contida.

7° A duração é, em geral, a continuação de um ser em sua existência. A duração temporal ou tempo, que pertence apenas aos predicamentos, é a duração de um ser sujeito à mudança, na qual se contam dois pontos, o que precede e o que segue. Numerus motus secundum prius et posterius. (Aristóteles, Phys., IV, 11).



8° e 9° As duas últimas categorias são a situação (situs), ou seja, a maneira de ser no lugar, como estar sentado, e a maneira de ser exterior (habitus), que resulta do que pertence ao corpo por aderência ou justaposição.

P. MIELLE